Miguel de Castro - Poeta do corpo, do sexo e das mulheres“Escrevo à base de emoção”, confessa Miguel de Castro, o poeta que este sábado (6 de Abril) lança o livro “Os Sonetos”, no Museu de Arqueologia e Etnografia do Distrito de Setúbal (17.30). O autor fixa textos que reflectem “experiências”, de toda uma vida de enamoramento e paixões. “Sou muito ligado à mulher, ao feminino, às coisas do amor e do sexo” , vai contando Miguel de Castro, enquanto despeja açúcar na chávena de café fumegante. A mulher, corrijo, as “mulheres” têm sido a cafeína de uma escrita torrente, desenfreada, por vezes, avassaladora. “Despertei para a poesia com as mulheres”, diz o autor, que encontrou nas "Folhas Caídas" de Almeida Garret o motor de arranque para as conquistas amorosas e abundante produção literária.
“Cada rapariga que namorava fazia-lhe um poema”
, conta, enquanto vai dissolvendo o açúcar na negra beberagem. É o lado
carnal que leva Miguel de Castro a passar para o papel as palavras e as frases
que vai construindo “de cabeça”. “Os Sonetos”, obra apresentada
por Viriato Soromenho Marques e António Cabrita, mantém-se fiel a um longo
percurso do “poeta pagão”, ou “poeta do corpo”
como gosta de se definir.
Miguel de Castro cedo se deu conta que a inspiração o
surpreendia nos momentos mais variados. “Um olhar, um cheiro, um
paladar, qualquer coisa pode desencadear um processo criativo”, relata
o autor. Sempre teve a “mania de ler”, talvez por isso, o pai
nunca se esquecesse de lhe trazer um “mimo” quando se ausentava
em viagem pelo país. Trazia-lhe sempre um “livro de contos, uma
novela”, que devorava com uma tremenda satisfação.
Aos poucos começou a dar-se conta de que as palavras, as frases
se juntavam na “cabeça” com uma facilidade e uma desenvoltura
inquietantes. Já adolescente, Miguel Castro deita o
“desassossego” no papel e, por intermédio de um amigo, é
apresentado a Sebastião da Gama. Já antes, os colegas de trabalho da EDP lhe
reconheciam o “jeito” para a escrita e demonstravam espanto
pela quantidade de poesias que escrevia em papéis avulso. Foi por isso que ficou
também apelidado de “poeta das dúzias”.
Era, na altura, uma “coisa tosca”, um
“campo a desbravar”, recorda.
Confrontado com os versos do poeta auto-didacta, Sebastião da
Gama de imediato atestou a qualidade da escrita – “Ele gostou muito dos
meus versos”, lembra. A partir daí, o poeta da Arrábida que
identificara uma “sensibilidade poética” em Miguel de Castro,
tornou-se um “guia de interesses” e foi “abrindo
portas”. Tornou-se um ritual diário a entrega de “um monte de
poemas” para que Sebastião da Gama orientasse a escrita
“torrencial”.
Em determinado dia havia de passar pela cabeça do autor
arranjar um pseudónimo para dar cara à poesia. Jasmim Rodrigues da Silva não lhe
parecia “nome de guerra”, daí que tenha sugerido a Sebastião da
Gama um nome invulgar - Jarosil Claus. O autor explica: “Já retirado a
Jasmin, Ro de Rodrigues e Sil emprestado a Silva”. Então como surge o
apelido Claus? O autor justifica-se dizendo que se tratava do nome de um
“sabonete que havia no Porto”. A proposta não passou no crivo
de Sebastião da Gama que logo lhe disse “o homem passou-se da
cabeça”. O mesmo Sebastião ditou que “Jarosil jamais, serás
Miguel de Castro”. E assim ficou!
Agora que do café sobra um contorno vago no bordo da chávena, e
cristais de açúcar lá no fundo, Miguel de Castro reconhece que tudo começou como
uma “brincadeira” mas havia de se consolidar. Na essência,
continua a ser o mesmo “lamechas”, “pinga-amor”, “lacrimejante”,
como todos os poetas. Falta acrescentar, “namoradeiro”
das palavras e dos afectos que continua a prender em forma de verso ou de sonata
– “Tenho-os todos na cabeça”, diz.
Todos, não acredito, disse de imediato, em tom de provocação.
Miguel de Castro afasta o boné, alisa o cabelo grisalho e destapa a memória –
“Este escrevi tinha 19 anos: Hoje é sábado / Tenho dinheiro, cigarros e
alegria / Tenho sonhos orgíacos e delírios! / Não há ninguém mais feliz do que
eu / Tenho vinho, música, mulheres, / Céus, astros e luas. / Hoje vou deambular
pelas ruas, / Cantar serenatas, / Arriscar a vida por nada / Morrer, sem glória,
em qualquer luta! / Ou, então, quando vier a madrugada, / Dar o braço a uma
prostituta, / E bêbado, / Aos tombos, / A granel, / Dormir um sono profundo, /
No bordel”.
Livros editados
Fruto Verde, 1950
Mansarda, 1953 Terral, 1990 A Sinfonia do Cú, 1990 Os Sonetos, 2002 |
Ricardo Nunes - 05-04-2002http://www.setubalnarede.pt/content/index.php?action=articlesDetailFo&rec=3119 |
sexta-feira, 11 de maio de 2012
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