domingo, 9 de janeiro de 2011

DIÁLOGO ENTRE NATHAN E THOMÉ


Surpreendi hoje em casa de Thomé Nathanael, meu mestre em antiguidades, o seguinte diálogo de si para si, que gravei no meu espírito por vir na correnteza de quanto tenho vindo a atar e a desatar:

NATHAN: Espanta que Képler, um astrónomo que era também um astrólogo, não tenha visto, ao ocupar-se do assunto, que pela observação do céu foi possível aos magos persas ver o lugar e a hora do nascimento do avatar, desde que tivessem aplicado o procedimento da moderna astrologia (por moderna significo vulgar ou científica) pelo qual, dada a hora e o lugar do nascimento de alguém, se desenha a carta do céu correspondente a essa hora e a esse lugar. Na palavra hora incluo, já se vê também o mês e o ano.
Escreveu René Guénon que, no episódio dos Reis Magos devemos ver o reconheci- mento da verdade do Cristianismo pelos superiores representantes da tradição primordial.


THOMÉ: Da verdade do Cristianismo? Sim, mas no sentido de que constitui uma nova e superior revelação e não no sentido de que veio dizer, mais uma vez, o que da suprema verdade já se sabia antes nas diversas religiões e tradições.

NATHAN: Seja como dizes. (...) A mim, porém, aquilo que vejo na adoração dos magos é o indesmentível sinal de que há uma íntima relação entre o Cristianismo e Zoroastro,
assim como se os magos, adorando-o reconhecessem em Jesus o Saoshiant das profecias.

Este o fragmento do diálogo, após o qual considerei o seguinte: A Pérsia fica a oriente da Judeia e só os seus sacerdotes eram, na Antiguidade, conhecidos pela palavra Magos. A palavra reis foi-lhes acrescentada depois.Vieram do mesmo lugar e não de regíões e de raças diferentes como quer a tradição popular. O Evangelho de S. Mateus, o único que se lhes refere, diz por este teor:
« «Nasceu Jesus em Belém da Judeia nos dias do rei Herodes; eis que uns magos, vindos das regiões orientais, chegaram a Jerusalém, dizendo: Onde está o rei dos Judeus que nasceu? Pois vimos a sua estrela no Oriente e viemos adorá-lo».

Não conheço o livro referido por Henry Corbin de G. Messina, OS MAGOS EM BELÈM E UMA PREDIÇÃO DE ZOROASTRO, mas parece, a avaliar pelo título, que a reflexão de Thomé Nathanael no espelho da sua alma não anda longe da verdade. Comentando-o a esse livro, escreveu Henry Corbin: «O lago é aquele cujas águas conservam o Xvarnah de Zaratustra donde se originará a concepção virginal do Messias Salvador. E é por isso que se compreende perfeitamente a razão por que a exegese cristã dá por realizada a profecia zoroástrica ao fazer com que os Reis Magos procedessem do Mons Victorialis».
Tudo isto dá que meditar.Todavia (...) é de correr o risco e conjecturar que o Anjo do Senhor, o Anjo da Face de Deus, que aparece na sarça ardente e Jesus Cristo sejam o mesmo e ambos o Amor, tal como o entende o nosso poeta (Camões), "a flama viva, o nunca morto lume", pelo qual nascemos, no qual vivemos e do qual esperamos que nos levante da morte.
É nesta espera que reside o messianismo de Camões.

"O Messianismo de Camões" in Viagem a Granada de ANTÓNIO TELMO